Escrito por: MPT-SC
Decisão também determina a readaptação funcional dos empregados em benefício de auxílio-doença acidentário e proibição de dispensas discriminatórias de empregados que necessitem de readaptação
Florianópolis – Uma decisão liminar da Justiça do Trabalho proíbe a COMCAP - autarquia responsável pelo recolhimento do lixo na capital - de submeter empregados a jornadas superiores a duas horas diárias. A empresa também deverá proceder, no prazo de 90 dias, a readaptação funcional de todos os empregados da empresa em benefício de auxílio doença acidentário e não proceder demissões discriminatórias. A liminar é favorável à ação civil ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho em Santa Catarina (MPT-SC).
A decisão da Juíza do Trabalho Ângela Konrath fixou multa de R$ 500,00 (quinhentos reais) por infração, no caso de jornadas exaustivas, R$ 100.000,00 (cem mil reais) por demissão discriminatória e R$ 10.000,00 (dez mil reais) por mês no caso de omissão na readaptação de empregados em auxílio doença acidentário.
Segundo a decisão “se o trabalho desenvolvido na empresa provoca no trabalhador lesão que torne necessária a readaptação, seja pelo ritmo ou pela natureza do trabalho, ou mesmo se o trabalhador adoece e tem mitigada sua força de trabalho, deve arcar com a responsabilidade social que lhe é decorrente e com os riscos da atividade a que se dedica. (...) Eventuais abusos, inclusive dispensas prematuras do benefício previdenciário, devem ser combatidas individualmente e não alterar a regra geral de que a COMCAP é responsável por readaptar seus trabalhadores”.
Para o Procurador do Trabalho Sandro Eduardo Sardá “a decisão judicial é de fundamental importância para assegurar a saúde e segurança dos empregados da COMCAP, sobretudo os garis que vem sendo submetidos a jornadas superiores a 15 horas diárias em atividades insalubres em grau máximo”.
Ainda de acordo com Sardá, “também restou comprovado que a COMCAP simplesmente demitia os empregados que, em contrato de experiência, sofriam acidentes de trabalho ao invés de proceder a readaptação funcional dos trabalhadores, pratica vedada pela decisão judicial prolatada”.
Da decisão cabe recurso junto ao TRT.
Entenda o caso
O Ministério Público do Trabalho em Santa Catarina (MPT-SC) ajuizou em 22 de janeiro de 2018, Ação Civil Pública em face a COMCAP (Companhia Melhoramentos da Capital), ao Diretor Presidente da Companhia e ao Município de Florianópolis com pedido de indenização por danos morais coletivos em valor não inferior a R$ 8 mi (oito milhões de reais).
Em inquéritos Civis de nºs 629/2008 e 731/2016 conduzidos pelos Procuradores Keilor Heverton Mignone e Sandro Sardá, respectivamente, ficou comprovado jornadas de até 15 horas e 30 minutos, por garis, na coleta de resíduos sólidos, principalmente na alta temporada de verão, dentre outras irregularidades.
A empresa também se nega a proceder a readaptação funcional dos empregados que foram vítimas de acidentes de trabalho, faz demissões discriminatórias, prorroga jornadas em atividades insalubres e não observa a redução da hora noturna.
O último inquérito foi instaurado em razão de decisão do TRT da 12ª Região (Acórdão 000312-82.2015.5.12.0036) que reconheceu a submissão de empregados da COMCAP a jornadas exaustivas.
Nas investigações chamou a atenção dos Procuradores o enorme contingente de acidentes laborais e doenças ocupacionais registrados com empregados da COMCAP. São centenas de trabalhadores adoecidos, vivendo de benefícios do INSS.
A tabela abaixo relaciona todas as Comunicações de Acidente de Trabalho (CATs) emitidas pela empresa e pelo sindicato da categoria ao longo dos anos, comprovando que no período de 2013 a 2016, ocorreram, no mínimo 1.289 acidentes de trabalho na Companhia que emprega cerca de 2.000 trabalhadores.
ANO
CID M – Distúrbios Osteomusculares
CID S – Traumatismos
Outros CIDs
TOTAL
2016
96 CATs
158 CATs
17 CATs
271
2015
104 CATs
207 CATs
24 CATs
335
2014
103 CATs
199 CATs
31 CATs
333
2013
107 CATs
224 CATs
19 CATs
350
1.289
O maior número de acidentes do trabalho e doenças ocupacionais ocorre com os garis, justamente em razão dos elevados riscos existentes na atividade, das jornadas superiores a 15 horas e da omissão da empresa em adotar medidas adequadas de prevenção, dentre as quais pausas de recuperação de fadiga (item 17.6.3 da NR 17). E, mesmo sendo responsável pelas causas dos adoecimentos e afastamentos, a COMCAP se nega a proceder a readaptação dos empregados em atividades compatíveis com as limitações existentes após a alta do INSS, situação que gera novos lesionados. Ou seja, demite os reabilitados e contrata novos empregados para a coleta de resíduos sólidos, uma atividade que as pesquisas comprovam ter uma imensidade de agentes de riscos.
Nas audiências realizadas no MPT com diretores da COMCAP, também participou a Chefe da Seção de Saúde do Trabalhador do INSS, Priscilla Lioi, que ressaltou o absoluto descaso da Companhia em proceder a reabilitação dos empregados lesionados.
Em relatório enviado pela Dra. Priscila ao MPT, o INSS revela a conduta discriminatória da empresa com a demissão dos empregados que necessitavam de reabilitação funcional. No documento a perita informa que, em resposta aos ofícios do INSS solicitando a reabilitação dos garis, a COMCAP se limitou a informar que diversos empregados não concluíram o período de experiência e não eram efetivos, configurando-se a demissões discriminatórias.
Segundo o Procurador do Trabalho Sandro Sardá, pelo que foi apurada ao longo das investigações, a COMCAP adota formas absolutamente inadequadas de organização do trabalho. E, “diante de tantas ilegalidades e da negativa em firmar Termo de Ajuste de Conduta não restou outra solução jurídica ao MPT, senão processar a empresa, seu Diretor Presidente e o Município de Florianópolis pelas graves violações aos direitos fundamentais dos trabalhadores”.
A ACP de nº 0000025-17.2018.5.12.0036 foi distribuída à 6ª VT de Florianópolis que postergou a análise da tutela de urgência após a apresentação da defesa pela COMCAP.
Empresa transporta garis irregularmente em jornadas de até 15 horas
Em decisão de junho de 2014 o Tribunal Superior do Trabalho (TST) condenou a COMCAP a pagar cem mil reais a título de dano moral coletivo e impediu a empresa de transportar garis nos estribos dos caminhões de lixo, em razão de Ação Civil Pública (ACP de nº ACP 0001857-74.2010.5.12.0001) ajuizada pelo MPT-SC.
Para os Procuradores do Trabalho Sandro Sardá e Luiz Carlos Rodrigues Ferreira, autor da Ação Civil Pública que condenou a COMCAP na questão do transporte irregular, “é absolutamente grave e inconcebível a conduta da empresa ao descumprir uma decisão judicial, agora com o agravante de jornadas exaustiva, colocando em risco a vida de centenas de trabalhadores que exercem uma atividade essencial para a saúde pública e são desrespeitados em suas garantias básicas de preservação da vida”.