As contradições da humanidade
Publicado: 12 Setembro, 2025 - 00h00 | Última modificação: 12 Setembro, 2025 - 09h02
Recentemente, em um grupo de estudos com lideranças do estado, debatemos as contradições entre a vida cotidiana e a consciência cristã, a partir de um capítulo do livro O Reino de Deus Está em Vós, escrito por Leon Tolstói no século XIX. A partir desta oportunidade de reflexão sobre o tema, me dei conta que muito dos absurdos realizados pela humanidade ao longo da história se repetem nos dias de hoje e nós aceitamos como se fossem normais, naturais e necessárias.
O texto fala de manipulação, doutrinação e dominação dos homens pela religião e pela política. E esta dominação se dá pela razão ou pela emoção, sendo suas convicções ou crenças. Chegando ao ponto da insensatez de sacrificar a sua tranquilidade, sua estabilidade social em defesa de algo incompreensível ou intangível sem pensar nas consequências. Acreditando em crenças e ideias, convencidos que estas crenças e ideias são as ideais para um bem comum mesmo que sejam incompatíveis com a sua realidade e necessidade de sobrevivência.
Tudo, ou quase tudo, na vida é contraditório, contrariando o que julgamos ser justo. Elas aparecem na vida pessoal e social, na política, na economia, nas relações diversas da humanidade, pois as ações são feitas baseadas na justiça e necessidades de quem as executa. Chegando ao ponto de trabalhadores, mesmo privados de suas necessidades básicas, muitas vezes defenderem seus próprios exploradores - fortalecendo projetos que aumentam a concentração de renda e o poder das elites. Apoiam governos e propostas de extrema direita que atacam diretamente seus direitos e interesses pessoais e coletivos.
Defendem projetos que lhe tiram a dignidade, a autoestima, condição humana de respeito a opinião de quem lhe é contraria. Projetos que obrigam os trabalhadores/as trabalharem mais e ganharem menos, ficarem doentes sem acesso a saúde os a programas sociais, que não respeitam as suas opções de vida religiosa, sexual e social. Mesmo assim as defendem como se fossem suas. Por outro lado, criminalizam e ignoram as ideias que vão ao encontro dos seus interesses, como valorização salarial, acesso à políticas públicas das mais variadas, direito de expressão e à soberania plena.
Outra contradição gritante está na política: todos querem representantes que defendam seus interesses, mas continuam elegendo parlamentares e governantes financiados por banqueiros, grandes empresários e especuladores - aqueles que não produzem, não geram empregos, mas concentram renda explorando a força de trabalho.
As nações falam em paz, mas, vivem se armando fortemente para defender e ampliar os seus territórios. Fazem guerras em nome da paz. Os jovens são educados com os princípios religiosos, como amar o próximo, perdoar os seus inimigos, não matar, não roubar, mas, estes mesmos jovens são convocados a ir à guerra para matar sem ao menos saber quem e porquê. As nações gastam milhões com armas cada vez mais letais, veículos, navios, aviões e exércitos para simplesmente matar outros homens, mulheres e crianças. Estes custos ainda vão para muito além, se considerar o aumento das dívidas públicas dos Estados, a diminuição da produção de alimentos e outras mercadorias de uso comum, com certeza esses valores vão muito além da nossa capacidade de compreensão e aceitação. Podendo usar muito menos recursos para alimentar e salvar vidas no mundo, educar, proteger a natureza, investir na ciência, investir na criação de empregos e em políticas públicas para o bem-estar da humanidade.
Ao contrário o que vimos é cada vez mais países cometendo genocídio com outros povos, guerras para se manter no “poder”. Em paralelo a outras guerras silenciosas, porém não menos danosas. A guerra da fome, mantendo uma enorme quantidade de pessoas na linha da miséria, sem ter o que comer. Esta realidade é visível em vários países mesmo tendo condições de resolver esta situação, simplesmente usando o bom senso e o respeito pela vida do próximo. A guerra ambiental pela extração dos minérios, exploração da fauna e da flora sem controle social, onde usadas as tecnologias capazes de transformar as vidas e o mundo ao nosso redor priorizando o progresso e o lucro sobre a sustentabilidade e a preservação.
O que fazer diante de tantas contradições?
Todos querem respeito, mas não respeitam os direitos e as opiniões dos outros;
Todos querem paz, mas, vivem provocando guerras e discórdias;
Ninguém quer ser explorado, mas, não perdem a oportunidade de explorar;
Ninguém quer ser roubado, mas, não perdem a oportunidade de roubar;
Todos têm a sua crença, mas, não respeitam a crença dos outros;
O que será do mundo e das próximas gerações? Os avanços das tecnologias serão capazes de amenizar estas questões? A política diplomática entre as nações conseguirá transformar os interesses na guerra pela paz?
São questões ainda sem resposta, desafios que recaem sobre as próximas gerações. O que está em jogo é a nossa própria humanidade e a esperança de que possamos construir um mundo mais justo, solidário e sustentável.
*Rogério é Secretário Geral da CUT-SC